domingo, 29 de agosto de 2010

Portugal, Sagres e a busca do Brasil por petróleo – Projetos estratégicos para duas nações

Os oceanos têm representado ao longo da história da humanidade o caminho e a fonte para as nações materializarem suas vocações. Os primeiros registros da jornada marítima dos homens remontam há mais de 800.000 anos. Através dos oceanos, Portugal conduziu, ao longo dos séculos XV e XVI, a maior expansão geográfica da história da humanidade, com viagens muito mais ousadas que as atuais expedições espaciais. As viagens da Era dos Descobrimentos, como costuma ser descrito aquele período, estão entre os acontecimentos mais importantes da história do mundo. A viagem portuguesa uniu duas partes ricas e dinâmicas do mundo que, anteriormente eram inacessíveis por navio. Um acontecimento comparável a este nunca ocorrerá novamente, a não ser que uma forma de vida avançada seja descoberta em outro planeta.

Pela necessidade de sobrevivência e impulsionados pela visão estratégica do infante Dom Henrique fizeram-se ao mar, no que também ficou conhecido como seu “transbordamento” como nação. Esse projeto, que durou cerca de 130 anos, iniciou-se com a conquista de Ceuta, em 1415, passando pela chegada de Cabral ao Brasil em 1500 e estendendo-se até 1543, quando os portugueses atingiram o Japão.

Nestes dias em que o Brasil, com a descoberta do reservatório do Pré-Sal, no campo de Tupi parece iniciar uma nova era, vale a pena uma reflexão a respeito das similaridades entre os projetos de duas nações que encontraram no oceano o caminho para fazer frente aos seus principais desafios com vistas à sobrevivência e à prosperidade: Portugal, com o processo de expansão marítima, e o Brasil, na sua busca pelo petróleo no oceano.

O mundo que testemunhava a chegada do homem à Lua, no final da década de sessenta, experimentava também o primeiro choque de petróleo, em 1973. Na medida em que os países produtores diminuíam a produção e os preços do barril de petróleo aumentavam - em apenas três meses, de US$ 2,90 para US$ 11,65 - evidenciava-se a importância geopolítica do principal combustível da humanidade. Nessa época, a Petrobrás era uma empresa que contava com vinte anos de existência, tendo recém iniciado suas operações marítimas, mais especificamente no campo de Guaricema, no litoral de Sergipe. Delineava-se naquele momento que, para o Brasil a auto-suficiência em petróleo significava buscá-lo no oceano.

Ainda na década de 70, com a descoberta do campo de Garoupa, na Bacia de Campos, e com o subseqüente início da produção daquele campo, em 1977, iniciava-se um consistente avanço do Brasil rumo ao Oceano Atlântico na busca por petróleo. No final dos anos noventa a exploração petrolífera, no Brasil, já chegava à incrível marca dos poços a mais de 1850 metros de profundidade.

Não há claras semelhanças entre os desafios vencidos pelos portugueses no século XV e as conquistas do Brasil, na sua busca por auto-suficiência em petróleo ? As principais similaridades entre estes dois projetos estratégicos encontram-se no seguinte tripé comum: busca pelo conhecimento e capacitação ; foco contínuo em uma expansão que se sustentasse financeiramente ; o desenvolvimento de soluções tecnológicas incrementais.

Com efeito, a busca pelo conhecimento levou Portugal a constituir aquela que ficou conhecida como a Escola de Sagres que, muito mais que uma escola no sentido literal da palavra, significava a concentração de recursos e talentos para planejar as viagens e aprender o máximo possível com cada uma das expedições, através da acumulação ordenada de informações. A Petrobrás, por sua vez, materializou sua busca pela capacitação com a criação de seu centro de pesquisas, em 1966, e em sua preocupação pioneira na formação de seus técnicos e engenheiros, repetindo a experiência bem sucedida de Portugal na busca pela capacitação de seu pessoal. O modelo de desenvolvimento da produção em “sistemas de produção antecipada” e mais modernamente, com o uso dos FPSOs, garantiu à Petrobrás a viabilidade econômica de sua expansão da produção no mar. À medida que as descobertas eram confirmadas, iniciava-se quase que imediatamente a produção, evitando que a alocação dos preciosos e escassos recursos financeiros ficasse aguardando muito tempo por retorno. De forma similar, Portugal, com a implantação das colônias ao longo do trajeto de sua expansão, praticava o que parecia ser o lema do infante Dom Henrique – mentor principal daquele projeto - explorar sim, "deficitar nunca!”.

Os principais desafios “tecnológicos” enfrentados por Portugal consistiam no aprimoramento dos meios navais, com o desenvolvimento das caravelas e, principalmente, o “descobrimento” do caminho de volta para casa. Ambos desenvolvidos progressivamente ao longo da expansão. O Brasil, em sua busca por auto-suficiência em petróleo, baseou suas soluções tecnológicas em um modelo incremental, ao invés de apostar em inovações radicais, adotando o conceito de melhoramento e aperfeiçoamento dos sistemas de produção nos quais já possuía experiência. Hoje, o Brasil é reconhecido mundialmente por sua competência tecnológica na exploração de petróleo em águas profundas, o que será um fator decisivo de sucesso para a implantação dos campos gigantes do Pré-Sal.

Impulsionados pela necessidade de encontrar soluções para problemas, no fundo, similares, Portugal e Brasil entenderam, cada um a seu tempo, seus desafios, estruturando competentes elos estratégicos, através de projetos auto-sustentados e buscando o que parecia ser o principal objetivo estratégico destas duas nações: conquistar a auto-suficiência - sejam especiarias ou petróleo - garantindo um lugar de destaque para seus povos no cenário mundial.

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